[Magia sem Lágrimas]: Ordo Astrum Argentum: Casa do Conhecimento & da Luz
- Fernando Liguori
- 18 de mar.
- 6 min de leitura

10 DE MARÇO DE 2025 E.V.
Care Frater,
Faz o que tu queres há de ser tudo da Lei.
Saudações Aspirante em nome da Estrela de Prata. Recebi a carta e sua sincera busca pelo Conhecimento não passa despercebida. As dúvidas que te afligem são naturais, e sei que a expectativa diante da Iniciação pesa sobre teus ombros. É sempre um sinal promissor quando um Probacionista se aproxima da alvorada de sua verdadeira jornada com inquietação e desejo de compreender melhor o caminho à sua frente. Permita-me, então, iluminar tua mente com aquilo que já foi revelado e o que cabe ao teu grau discernir.
É natural que, ao se aproximar da transição de Probacionista para Neófito, tua alma clame por compreensão e por certeza no caminho que escolheu trilhar. Sei que desejas compreender os rituais da A∴A∴, suas formas e métodos e, em particular, tens ouvido rumores sobre antigos rituais coletivos, como Liber DCLXXI vel Troa. Permita-me, pois, esclarecer este ponto com precisão e profundidade, pois tua jornada demanda que a Verdade te seja revelada.
Antes de tudo, deves compreender a natureza da A∴A∴. Não somos uma Ordem como as que vieram antes, e nossa iniciação não se dá por meio de grupos, congregações ou hierarquias externas, mas pelo esforço individual do Aspirante em sua comunhão direta com a Verdadeira Luz. Quando Frater Perdurabo (Aleister Crowley) e Frater Achad (Charles Stansfeld Jones) criaram a estrutura da Ordem, eles a moldaram com base no que compreendiam como sendo a Iniciação, inspirando-se nas tradições da Ordem Hermética da Aurora Dourada. Contudo, essa base logo se revelou inadequada para a missão que tinham em mãos. Assim, sem qualquer autoridade externa a guiá-los, sem a tutela dos Chefes Secretos, eles se lançaram como construtores de navios, tentando alcançar o Reino da Estrela de Prata, mas ainda sentindo-se indignos diante do Santuário Interior. Isso mudou em 10 de dezembro de 1906 e.v., quando Crowley registrou em seu diário: Jones diz que Ou Me é 8°=3, eu digo Mollie Lee thymes ambos. Isso me purifica e consagra, de modo que sinto «Eu sou genuíno, sem escrúpulo ou diferença. Nenhuma personalidade».
Essa declaração pode parecer enigmática, mas a chave está em Confessions, onde ele escreve: No mês de dezembro, os Chefes Secretos formalmente me convidaram, através de G.R. Frater D.D.S., a tomar meu lugar oficialmente na Terceira Ordem. Foi nesse momento que Crowley assumiu o grau de Magister Templi 8°=3, compreendendo que seu destino era carregar um fardo particular pelo bem da humanidade. Como Magister, sua responsabilidade era cuidar de um jardim de Conhecimento que não poderia ser transmitido abaixo do Abismo. Isso se tornou ainda mais evidente quando, percebendo as limitações da Aurora Dourada, ele entendeu que deveria reformular completamente o sistema de iniciação. Como é dito em Uma Estrela à Vista: Os membros da Terceira Ordem [...] são cada um deles autorizados a fundar Ordens dependentes de si mesmos nos moldes das Ordens R. C. e G. D., cobrindo tipos de emancipação e iluminação não contemplados pelo sistema original (ou principal). Todas essas ordens devem, no entanto, ser constituídas em harmonia com a A∴A∴ no que diz respeito aos princípios essenciais.
É com base nessa autoridade que Crowley estabeleceu a A∴A∴ como a conhecemos hoje, constituída de uma Primeira e Segunda Ordens sob a égide da Terceira, e aboliu os antigos rituais coletivos. Como bem sabes, na Aurora Dourada, nenhum iniciado havia jamais ultrapassado o grau de Adeptus Exemptus 7°=4, pois acreditavam que os três graus finais na Árvore da Vida eram inalcançáveis por aqueles que ainda estavam encarnados. A ideia de que um ser humano poderia tornar-se um Chefe Secreto em vida era-lhes estranha. Isso mudou quando Crowley cruzou o Abismo e assumiu o nome de Vi Veri Vniversum Vivus Vici (Pelo poder da Verdade, Eu, em minha vida, conquistei o Universo).
Agora, meu jovem Irmão, entendes porque não há rituais coletivos na A∴A∴. Quando Crowley estruturou a Ordem, percebeu que os métodos antigos não serviam ao Novo Aeon. Ele mesmo tentou, por um tempo, formular iniciações no estilo da Aurora Dourada, mas logo as abandonou. Liber DCLXXI vel Troa, o ritual que te causou dúvidas, era um desses. Nele, o candidato era conduzido por dois oficiais – o Hiereus e o Hegemon – como na tradição maçônica. Mas esse método não era suficiente para a verdadeira iniciação. Em 4 de outubro de 1908 e.v., enquanto realizava seu retiro mágico descrito em João São João, Crowley escreveu: Agora me sento para meditar sobre este novo ritual.
Foi nesse momento que ele abandonou os rituais coletivos e criou Liber Pyramidos, um verdadeiro rito de iniciação individual. Esse ritual, meu Irmão, será o que terás de atravessar para cruzar a soleira e tornar-te Neófito. Diferente de qualquer outro, é um rito solitário, realizado apenas pelo próprio candidato, onde ele confronta sua própria Alma e seu Sagrado Anjo Guardião. Não há mestres segurando sua mão, não há guias externos – apenas a Luz interior que deves encontrar por ti mesmo.
Ainda assim, alguns grupos modernos, desde a década de 1980 e.v., decidiram reviver esses ritos coletivos ultrapassados, utilizando Liber Troa e outros como forma de iniciação. Nenhum desses ritos foi jamais realizado por Crowley ou por Karl Germer, seu legítimo sucessor. Estes grupos, ao retornarem às velhas formas, apenas querem parecer detentores de segredos que não estão disponíveis nos livros, mas a verdade é clara: a iniciação da A∴A∴ é individual.
Portanto, Aspirante, ouve bem estas palavras: teu Caminho é solitário. Não há sacerdotes que te conduzam, não há cânticos que te elevarão, apenas tua própria Vontade e tua própria Luz. Quando chegares ao limiar de tua Iniciação, será apenas tu e o Silêncio. Mas não temas: aqueles que cruzaram antes de ti estão observando, e tua passagem ecoará pelo tempo e pelo espaço.
Que as palavras desta carta ressoem em tua alma como um chamado à Verdadeira Vontade. Agora que compreendes a essência solitária de tua Iniciação, é fundamental que voltes teus olhos aos Livros Sagrados de Thelema, pois neles repousam os segredos que não podem ser ensinados, mas apenas desvelados na alma do Adepto.
Medita, sobretudo, sobre as parábolas ocultas em Liber LXV, pois estas são espelhos onde tua própria jornada será refletida. Entre todas, permito-me indicar-te uma em especial, que há de guiar teus passos nesta travessia: a Parábola da Imagem Pálida do Ouro Fino (Cap. II, Vs. 7-17).
Nela, o Escriba, movido pela paixão ardente de seu coração, atira-se ao Rio da Vida, onde avista uma imagem dourada de Asi – um reflexo da divindade moldado no ouro mais fino. Encantado, ele a adora com toda a flor de sua juventude, oferecendo-lhe incenso, amor e devoção. Mas, com o tempo, algo terrível acontece: a imagem não responde, não se move, e começa a escurecer. O ouro resplendente torna-se negro, maculado pelo próprio fervor do aspirante, que, sem perceber, adorava a sombra da Verdade, e não sua Essência.
Diante da decepção e da dúvida, o Escriba quase abandona sua jornada, quase se lança de volta à correnteza do esquecimento. Mas ele persiste. E então, no fim marcado, a Deusa se ergue em sua Glória Verdadeira – mais branca que o leite das estrelas, seus lábios rubros e ardentes como o ocaso, sua presença uma chama viva como o fogo do Sol do meio-dia. E nesse instante, o Escriba compreende que ela nunca havia mudado – fora ele quem mudara.
Essa parábola, meu Irmão, é o espelho da tua própria Iniciação. Tudo que aprenderes, tudo que venerares, tudo que buscares, no início parecerá reluzente e perfeito – mas cedo ou tarde essa imagem se mostrará imperfeita, pois não passa de um reflexo. Muitos se desesperam nesse momento, perdem a fé, abandonam o Caminho. Mas aqueles que persistem, aqueles que não confundem a casca com o fruto, atravessam o véu da ilusão e encontram a Verdade viva, em seu esplendor mais puro.
Portanto, Aspirante, não te contentes com a imagem. Se teu coração busca a Verdade, não te prendas às formas, aos ritos, aos nomes ou às aparências externas. A Verdadeira Luz está dentro de ti, e tua jornada em direção a ela é solitária – mas também gloriosa.
Que o Fogo da tua Vontade te guie. Que a Estrela de Prata te ilumine.
Amor é a lei, amor sob vontade.
Fr. AHA-ON, 777 ∵
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